A prefeitura de Porto Alegre pretende enviar à Câmara Municipal, nos próximos dias, um pedido de autorização para vender cerca de uma centena de imóveis do município, incluindo prédios como o da antiga Secretaria de Obras e Viação (Smov) – o que mobiliza protestos de urbanistas – o da Epatur, na Cidade Baixa, e a estrutura onde fica a sede gaúcha da Associação dos Dirigentes de Marketing e Vendas do Brasil (ADVB), próximo à orla, entre outros edifícios e terrenos. A lista definitiva está em fase final de elaboração.
A listagem será encaminhada aos vereadores como um anexo do projeto de lei que cria um novo programa de gestão do patrimônio imobiliário da cidade. Uma das iniciativas previstas é a criação de um fundo em que seriam depositados os recursos obtidos com as negociações dos bens. Esse dinheiro seria utilizado exclusivamente na recuperação e manutenção de outros espaços da cidade – incluindo instalações da prefeitura, equipamentos urbanos, parques, praças, locais como o Mercado Público ou ações de revitalização de zonas como o Centro Histórico.
— Em uma perspectiva pessimista, as vendas poderiam render cerca de R$ 1 bilhão. Esse dinheiro não entraria no caixa único, mas seria reinvestido no nosso patrimônio — afirma o secretário de Administração e Patrimônio da Capital, André Barbosa.
Apesar da expectativa de receitas elevadas, nem sempre é fácil encontrar compradores para os itens listados. No ano passado, de um edital com 11 imóveis, três foram vendidos. O restante será oferecido outra vez por meio do novo programa de gestão patrimonial.
Barbosa explica que grande parte dos locais a serem ofertados não tem uso ou não oferece condições adequadas para o serviço público. O prédio da antiga Smov, hoje rebatizada como Obras e Infraestrutura (Smoi), será desocupado com a transferência das repartições para o novo centro administrativo criado em uma estrutura de 18 andares que pertencia à Habitasul, no Centro.
— O edifício da Smov é antigo, com problemas de estrutura, de infiltração, sem condições de uso pelo município. A relação custo-benefício não compensa reformá-lo — afirma o secretário de Patrimônio.
Pela localização privilegiada, na Avenida Borges de Medeiros próximo à Ipiranga, o imóvel está avaliado em R$ 37,3 milhões. Só o terreno é estimado em R$ 14,8 milhões, conforme os cálculos da prefeitura.
Embora a lista final dos bens a serem vendidos ou envolvidos em permutas ainda não seja divulgada na íntegra pelo fato de não estar concluída, GZH apurou que inclui ainda itens como um prédio localizado no número 1.780 da Rua dos Andradas, terrenos em pontos junto à José do Patrocínio e ao lado do Boulevard Laçador, endereços tradicionais como a antiga sede da Epatur, diante do Largo Zumbi dos Palmares, além da sede regional da ADVB.
Risco de demolição de prédio da Smov mobiliza urbanistas
A intenção de venda do antigo prédio da Smov, que poderia ser demolido pelo comprador caso tenha planos de dar outro uso ao terreno de 5,3 mil metros quadrados em um ponto nobre da cidade, mobiliza arquitetos e urbanistas com o objetivo de preservar a construção.
Especialistas consideram que o edifício de sete pavimentos, inaugurado em 1970, tem valor histórico e cultural como um dos ícones da arquitetura modernista na cidade e precursor de técnicas como uso de partes pré-moldadas.
Professor da pós-graduação da Faculdade de Arquitetura da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Sergio Marques ajudou a formular um parecer técnico defendendo o tombamento da estrutura em 2018. A solicitação, porém, até o momento não resultou em listamento em inventário ou tombamento – o que poderia impedir uma eventual demolição.
— O edifício tem qualidades artísticas e arquitetônicas, uma organização funcional em planta livre (as divisórias internas podem ser removidas ou rearranjadas), com um núcleo central, e o restante da estrutura externa — avalia Marques.
O presidente do Instituto de Arquitetos do Brasil no RS (IAB/RS), Rafael Passos, lembra que o projeto foi assinado por figuras de relevo: Moacyr Moojen Marques (pai de Sergio Marques), João José Vallandro e Léo Ferreira da Silva. Moojen, morto em 2019, coassinou outras criações célebres, como o auditório Araújo Vianna, a refinaria Alberto Pasqualini (em Canoas) e a urbanização do Praia de Belas. O Conselho de Arquitetura e Urbanismo do Estado (CAU/RS) também defende a preservação.
— Seria uma perda irreparável. Dali se disseminou a arquitetura moderna para todo o Estado — avalia o coordenador da Comissão Especial do Patrimônio Cultural da CAU/RS, Fábio Müller.
Professor do curso de Arquitetura e Urbanismo da Unisinos, Marcelo Arioli Heck avalia que a estrutura do edifício em planta livre é uma vantagem para sua continuidade, já que possibilita diferentes configurações dos ambientes em cada andar:
— Poderia ser adaptado para diferentes usos. Não precisaria demolir um prédio inteiro, com uma estrutura forte, que possibilita uma eventual mudança de utilização.
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